PIANO IVERS & POND

O Raro Piano Quadrado Ivers & Pond: Um Tesouro do Século XIX em Restauração

Por Carlos Santana

Entre os instrumentos mais raros que já circularam pelas Américas, o piano quadrado Ivers & Pond, também conhecido como square piano ou popularmente como “Cocked Hat”, ocupa um lugar de destaque não apenas pela sua construção única, mas pela sua presença histórica na transição entre o cravo e o piano moderno. O exemplar que estamos restaurando é um verdadeiro tesouro de 1820, um dos poucos ainda existentes em condições de restauro.

Breve História do Piano Quadrado (Square Piano)

Os pianos quadrados surgiram por volta de 1760, na Alemanha e Inglaterra, popularizando-se especialmente durante o período Georgiano e Vitoriano. Tinham como principal característica a disposição horizontal das cordas e sua forma retangular semelhante a uma mesa. Foram os precursores dos pianos de armário e verticais, muito usados em residências aristocráticas do século XIX, antes da industrialização dos pianos de cauda compacta.

Durante o século XIX, nos Estados Unidos, várias empresas começaram a fabricar esses modelos, mas poucos conseguiram o nível de acabamento, sonoridade e resistência das peças fabricadas pela Ivers & Pond Piano Company, fundada em Boston por volta de 1880. Contudo, este modelo específico que estamos restaurando foi fabricado bem antes da fundação oficial da marca sob esse nome — indicando que o piano pode ter vindo de empresas antecessoras que deram origem à Ivers & Pond ou foi erroneamente atribuído. Muitos dos square pianos da época entre 1820 e 1840 eram etiquetados com nomes de construtores que depois se fundiram ou foram adquiridos.

Uma Raridade em Madeira Nobre

Este piano é um exemplar do período Vitoriano, com estrutura construída em carvalho maciço na parte inferior, característica incomum mesmo em pianos da época, que geralmente usavam pinho ou abeto. A resistência dessa madeira explica o estado de conservação quase impecável, sem qualquer vestígio de cupins ou carunchos após mais de dois séculos.

Além do carvalho, é possível observar detalhes entalhados manualmente e partes externas revestidas com madeiras exóticas envelhecidas naturalmente, cuja maturação conferiu um brilho e textura incomparáveis. Seu peso estimado supera os 500 kg, exigindo grande cuidado em qualquer transporte ou movimentação.

O “Elefante Branco” da América do Sul

Pouquíssimos exemplares de pianos quadrados sobreviveram à industrialização, guerra e abandono nos últimos dois séculos. Estudos recentes apontam que existem, em média, cerca de 1.400 exemplares desse modelo em toda a América do Sul. Porém, em bom estado e com potencial de restauração, são ainda mais raros.

Na América do Norte, há alguns preservados em museus e residências históricas. Já no Brasil, ele é verdadeiramente um “elefante branco”: gigantesco, raro e digno de admiração.

Em Processo de Restauração

Atualmente, o piano encontra-se em fase de restauração completa, com foco na preservação máxima de seus componentes originais. O objetivo é devolver-lhe não apenas a beleza estética, mas também sua capacidade sonora — que, segundo registros, oferece um timbre suave, semelhante ao de um cravo com mais profundidade.

Todo o processo inclui:

Imunização preventiva da madeira
Polimento e tratamento das madeiras nobres
Substituição cuidadosa dos feltros e abafadores
Afinação e tensionamento gradual das cordas originais (sempre que possível)
Preservação da identidade visual histórica, respeitando os elementos decorativos originais.

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Conclusão: Uma Janela para o Passado

Restaurar um piano como este não é apenas devolver som a um instrumento: é reviver parte da história da música ocidental. O piano quadrado da Ivers & Pond, fabricado em torno de 1820, é uma peça que carrega consigo a transição da música clássica para os salões domésticos do século XIX, sendo testemunha da evolução do gosto musical e do desenvolvimento tecnológico dos instrumentos.

É uma honra poder trabalhar na revitalização de um monumento como este. Em breve, ele estará novamente pronto para ser admirado — e ouvido — como há mais de duzentos anos.